segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Bem-vindo ao Grid, programa


Um engenheiro de softwares chamado Kevin Flynn trabalha numa grande empresa do ramo informático, a ENCOM, e em paralelo, toca, incansavelmente, projetos independentes de desenvolvimento de jogos para videogames. Tentava com isso montar a sua própria empresa, mas um colega de trabalho rouba os projetos do engenheiro, ganhando notoriedade e promoções. Qualquer relação com o Vale do Silício, Bill Gates e Steven Jobs é mera coincidência (ou não), pois estamos falando de Tron, um dos primeiros filmes a utilizar efeitos de computação gráfica na história do cinema.

Tron: uma odisseia eletrônica
Pra quem ainda não viu, o longa-metragem cibernético da Disney data de 1982 e já tratava, metaforicamente, dos conceitos sobre realidade virtual. No enredo, os seres humanos se projetam no Grid (mundo digital da história) como sendo programas que se enfrentam para sobreviver aos desígnios do PCM (Programa de Controle Mestre).

Em meio às fraudes na ENCOM, Kevin procura provar sua inocência através de invasões aos programas da empresa. Por meio de um dispositivo que digitaliza objetos do mundo da vida e os materializa no mundo digital, Kevin é detectado pelo PCM e acaba sendo materializado no Grid. Começa, então, uma odisseia eletrônica que só seria reatualizada após mais de 20 anos de sua gênese: no final de dezembro estreia em todos os cinemas do mundo a continuação do lendário cult ciberpunk, Tron Legacy.

As metáforas virtuais do mundo atual

Em sua continuação, Tron contará a história do filho de Kevin, transferido para o Grid por razões óbvias. Com um enredo simples e uma estética ciberfuturista  que bebe da fonte clássica de Blade Runner, ou mesmo do mais recente Matrix, Tron Legacy se constitui como uma hiper experiência visual. Podemos esperar pérolas das imagens em 3D, como os fragmentos em direção à tela, gerados quando um “programa” é deletado ou algum veículo é destruído. Mas mesmo com um enredo minimalista, há espaço para refletirmos sobre os conceitos visuais de Tron.

O mundo virtual do filme é uma espécie de megalópole, repleta de luzes em suas conexões viárias e na indumentária dos personagens, representadas como verdadeiros circuitos integrados de placas eletrônicas. Da mesma forma, a representação das pessoas, por serem programas regidos por um sistema central, faz-nos pensar em regimes sociais  e normas de conduta pré-existentes ao indivíduo antes mesmo deste nascer, o que conota uma ideia de indivíduos programados para executar linhas de comando.

Ao indagar a uma personagem sobre a sua função no Grid, o filho de Kevin escuta uma resposta simples e direta da moça: “Sobreviver!” E só. Pois o que seria a vida senão uma tentativa desenfreada de resisitir aos percalços e lutar por algo que não fazemos a mínima ideia? Jogo e vida são conceitos indissociáveis em Tron, onde jogamos para viver e vivemos a fim de jogar.

Mas a metáfora mais surpreendente está representada na arma do jogador. Um disco, artefato que nos remete a duas relações de espaço/tempo: à Grécia antiga, da qual adveio um dos primeiros jogos olímpicos, o arremesso de discos, bem como à atualidade, que se caracteriza pela presença massiva do digital, dos artefatos midiáticos e de uma guerra silenciosa, que não se realiza mais por via das armas. Uma guerra financeira, travada por mecanismos informacionais que têm nos discos rígidos um dispositivo representativo da estocagem de conhecimento e, consequentemente, de poder.
 
E, claro, a velocidade e a astúcia. A metáfora dos tempos efêmeros e competitivos perpassa em milésimos de segundo os inúmeros feixes de luz na cauda dos caminhos traçados pelas motos do filme, sinalizando também para os movimentos astuciosos dos jogadores que reduzem os adversários a fagulhas pixelizadas.

Ambientes sombrios, efeitos visuais de deslocar a mandíbula, realidades sintéticas e imersão contemplativa são alguns dos atrativos que fazem de Tron Legacy um dos filmes mais ansiados do momento, provando que as produções da década de 1980 perduram na memória ROM dos programas atuais mais saudosos.
 

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