sábado, 22 de outubro de 2011

Às próximas fases

A penúltima semana de outubro terminou fervendo com os lançamentos mundiais e as prévias em vídeo de games muito aguardados, como Uncharted 3. A grande “jogada” de marketing foi convidar Harrison Ford para conhecer o game, fazendo caras, bocas e trejeitos de um Indiana Jones que continuará sendo lembrado na pele de Drake, protagonista aventureiro do jogo. O vídeo deixa nas entrelinhas audiovisuais a desanimadora sensação de um Ford velho, cansado, que recorre aos joysticks para executar saltos mirabolantes e escapar de armadilhas idem. Nem isso o velho Indy consegue.


Batman: Arkham City foi realmente o grande lançamento da semana. Uma legião de fãs que aguardavam o game, sonhando através dos vídeos de divulgação, agora já podem ter acesso ao petardo da Rocksteady. Quem acompanhou o primeiro título do universo Arkham sabe do que estou falando: gráficos surpreendentes, enredo bem elaborado, boa dosagem de dificuldade e excelente curva de aprendizado. Enfim, um jogo completo, sem contar com o novo movimento de queda livre aérea, que é espetacular.

Diferente de games de super-herói como Spider Man: Shattered Dimensions (o qual trabalha com um enredo mais bem humorado, tendo em vista o perfil do Aranha) Batman: Arkham City promete continuar fazendo a linha séria, mostrando a face dura e sombria que fez a fama do herói no memorável quadrinho do Cavaleiro das Trevas. Em meio a inúmeros inimigos desarmados, encarnamos um homem-morcego confiante, super-herói. Mas ao nos depararmos com meia dúzia de escopetas (como ocorria no Arkham Asylum) o game se transforma: Batman sai da condição de herói e se mostra humano, demasiado humano, e limitado. O jeito é montar uma estratégia, uma tática astuciosa para sair das enrascadas com vida. Esse é o ponto-chave do elemento tensão no game.

Pra terminar, tivemos o comunicado oficial do lançamento do portátil Playstation Vita para 22 de fevereiro de 2012. A data unifica o lançamento ocidental da máquina nos Estados Unidos, Canadá, Europa e Brasil. Outros países da América Latina também tiveram a data de 22 de fevereiro confirmada, mas podendo sofrer algum atraso em relação a procedimentos político-fiscais. Preços? U$250 (versão mais simples apenas com Wi-fi) e U$300 (versão completa, com Wi-fi e 3G). O Vita chega a ter gráficos tão potentes quanto os de PS3 e possibilidades de interface muito avançadas, através do touch frontal e touch por detrás da tela.

Particularmente sempre gostei dos portáteis. Mesmo aqueles games que vinham 999 jogos, com o Tetris como game padrão de fábrica. Tive alguns da Tec Toy, como o mini-game do Pit Fighter, mas não cheguei a comprar nem o Game Boy, nem o Game Gear. Diante de jogos para celular, Nintendos 3DSs, PSPs e agora Vitas, a impressão é a de que os tempos passam e levam consigo, cada vez mais, uma parcela da nossa inocência cultural. A imagem de Harrison Ford interagindo com Drake faz ressuscitar o discurso benjaminiano acerca da perda da aura (a título de metáfora, visto que Indiana Jones também é um produto da reprodutibilidade técnica): nunca mais veremos o grande Indiana em suas memoráveis aventuras, não porque o ator está mais velho, mas porque a essência midiática da narrativa se foi, ou melhor, permanece num outro tempo. Agora, as fluidas imagens descartáveis se impõem, narcotizando-nos atemporalmente, apesar de que a luta entre o velho e o novo é inevitável; é necessário ao aparecimento da planta o desaparecimento da semente. Se Batman, Lara Croft ou Drake, não interessa: sempre haverá uma próxima fase.




terça-feira, 18 de outubro de 2011

Vende-se um adaptador de estórias

Fonte: http://www.gameworld.com.br/4855-ARTIGOS-Ideia-de-jogo-GAMESFODA-


"Desde a popularização da televisão, educadores tentam passar aos jovens o hábito da leitura sem muito sucesso. Com o advento dos jogos eletrônicos, essa tarefa se tornou ainda mais difícil. Por outro lado, muitas pessoas começaram a ler quadrinhos por causa de Marvel VS Capcom, assim como muitas pessoas passaram a entender alguma coisa de mitologia grega por causa de God of War. Baseado nisso, sugeri há algum tempo atrás no Twitter uma ideia de jogo que trago hoje de forma expandida pra facilitar o trabalho da CAPCOM e do Ministério da Educação (não precisam agradecer) e ver se eles se animam".
O trecho acima foi retirado da coluna semanal do GAMESFODA, no portal GameWorld. O bom humor de ideias como essa já se refletiram em jogos de luta entre filósofos, figuras religiosas e diante de propostas no mínimo hilárias, podemos refletir um pouco sobre o processo de adaptação entre as mídias. Numa época em que os adaptadores deram lugar aos emuladores, a moda agora é adaptar entre mídias.


Quando falamos em adaptação logo nos lembramos dos fracassos cinematográficos e de algumas poucas experiências que se safaram dentro da relação cinema/videogame. Quando o filme vira jogo a experiência é menos desastrosa do que o contrário. Exceto o caso clássico do game Et: O Extra-terrestre em que o filme homônimo foi transformado em uma terrível adaptação para o Atari, em 1982. Os usuários que compraram o título devolveram os cartuchos aos montes e aqueles que ainda pensavam em comprar deixaram o prejuízo para as lojas. Resultado: pilhas e pilhas de cartuchos enviados para um aterro nos Estados Unidos, tornadas lixo e enterradas como tal. Nascia ali uma crise no setor, conhecida como o crash dos videogames de 1983. Com gráficos tão incipientes, o resultado não poderia ser outro.

Imagem do jogo E.T., do Atari.
Mas vieram novos consoles, novas tecnologias, melhores gráficos, altas definições. E os games de filmes passaram a contar as histórias do cinema fidedignamente, além de trazer elementos novos que ficaram de fora das narrativas audiovisuais, como é o caso do game Enter the matrix, que traz várias sequências fílmicas gravadas com atores reais participantes do filme, e The lord of the rings: the fellowship of the ring, do Playstation 2, que inseriu o personagem Tom Bombadil, presente no livro e ausente no filme. Hoje, as adaptações de filmes como X-Man, Iron Man, Thor, entre outros, não deixa nada a desejar nas telas dos games. Já o contrário...

É difícil adaptar da linguagem dos games para a dos filmes. Aliás, como podemos definir as constituições específicas da linguagem videogame? Uma linguagem que ela própria se adapta o tempo inteiro, diante de novas experimentações dos produtores, de diletantes e aficcionados através dos mods, de criadores que estão fora do eixo comercial e trazem ideias inovadoras e cheias de imaginação em games como Limbo. Um outro problema é que a grande maioria dos bons diretores e roteiristas ainda não acreditam na potencialidade do game e no retorno de bilheteria que um bom filme de um game pode render.

Comix Zone, aclamado game da Era Mega Drive.
O diálogo entre os quadrinhos e os games também é bastante antigo. Do game para os quadrinhos lembramos aqui da adaptação de Tomb Raider, em que a protagonista Lara Croft atuou na revista com a heroína Witchblade. O gibi ficou muito bom, mas rendeu poucas sequências. Na época da produção, a revista Ação Games vendeu algumas de suas edições com gibis da série como encarte promocional. Também não foi muito longe. Já o contrário, do quadrinho para o game, a grande referência é o sensacional Comix Zone, do Mega Drive. O jogo não se baseava em nenhum gibi, mas toda sua estrutura (ambiente, personagens e narrativa) era tal qual uma história em quadrinhos. O personagem principal, um desenhista, é tornado refém do próprio vilão que construiu com seus traços, indo parar no interior da sua história, um tema recorrente.

Bom, e quanto à literatura? Há possibilidade de boas adaptações entre games e livros? Claro, existem as experiências de narrativas interativas, em que o jogador se depara com elementos hipertextuais e hipermidiáticos no decorrer de sua passagem pela mídia. Mas e quanto a tomar uma obra clássica e transformá-la em game? O contrário já vem acontecendo: Resident Evil é um bom exemplo de game que virou livro e, recentemente, a Editora Record editou Assassin’s Creed: Renascença, de Oliver Bowden, com tradução de Ana Carolina Mesquita. O livro já vai em sua 3ª edição e narra fielmente os eventos jogados em Assassin’s Creed 2. Pelo que li (estou na metade do livro) o autor se circunscreve a um estilo mais descritivo para relatar os momentos interativos do game, mas nem por isso a obra se torna enfadonha. Por se tratar de uma aventura, a abordagem mais psicológica ficou em suspenso. Será que o gênero pega?

Particularmente também já conjecturei sobre adaptações de obras clássicas para games, como Os Maias, de Eça de Queirós. Com os gráficos 3D de última geração, veríamos Pedro da Maia em terceira pessoa e experimentaríamos catarticamente sua pulsação nervosa, no momento de seu suicídio, através da vibração de um dual shock. Nadaríamos com Carlos Eduardo quando criança e daríamos bengaladas em Dâmaso quando adulto, através de sequências de botões, tais como as de God of War. Por que não? Não há mercado? Então, dane-se o mercado: invistamos em projetos culturais nacionais através dos games e façamos com que a mídia videogame possa dialogar, também, com o livro (um evento no jogo pode depender do conhecimento de determinada sequência na história literária, o qual só será obtido através da leitura, por exemplo). Porque “é próprio das coisas, a mudança”, como diria o velho Dom Afonso, e quem vos fala com citações literárias é um viciado em games que só não joga mais porque o tempo não deixa.